7 de jul. de 2012

O PERIGO DA NECESSÁRIA "TRADIÇÃO".

Tradição e cerveja são coisas inseparáveis, afinal, o que concede estatuto e validade à bebida é necessariamente sua tradição. Longas cronologias são divulgadas em diversos sites e em pesquisas acadêmicas a respeito do precioso líquido, remontando o início desta tradição aos Sumérios, + - 6000 a.C., mas é na Alemanha que vemos surgir a cerveja tal qual conhecemos hoje.

A partir daí, identificamos a escola alemã, encontramos a tradição da escola belga, reconhecemos tradição à pilsner tcheca, às ales inglesas e mais recentemente, a cerveja americana vem recebendo a atribuição de escola.

Toda esta história da um gosto especial a cada cerveja, afinal, ao menos eu acredito, a tradição agrega valor conceitual à cerveja e muitas vezes, sinto como se estivesse dando um gole em séculos de história.

Mas a tradição, pelo menos o apego exagerado a ela, pode não ser o único, ou o melhor caminho a se tomar. Como estudante de História da Arte, vejo diversos exemplos, em que a tradição desemboca em puro conservadorismo, o que caba engessando as coisas. É claro que ela deve ser estudada, pois é a pedra fundamental de um grande "desenvolvimento", seria absolutamente impossível entender a Arte Medieval, o Renascimento e posteriormente o Romantismo se não tivermos uma boa base no bendito Platão, mas pensar o Barroco ou mesmo a Arte Contemporânea nos mesmos termos seria complicadíssimo.

Baco. Óleo sobre tela,  1593-1594
Galleria degli Uffizi, Firenze
Cito com exemplo a noticia da vez no mundo da História da Arte. No Castello Sforzesco, em Milão, foram encontradas 100 obras que agora estão sendo atribuídas ao mestre barroco Michelangelo Merisi dal Caravaggio (site do projeto). As obras constam no acervo que reúne as obras e Simone Peterzano e seus alunos, um deles o próprio Caravaggio. Seria uma ótima noticia (e de fato é) se pensarmos que agora temos mais material de estudo, mas vamos pensar por outro lado, vamos pensar como aqueles estudiosos que passaram a vida estudando Caravaggio e vamos imaginá-los arrancando os cabelos com a possibilidade de que sues estudos tenham ido por água abaixo, ou  basicamente apagados do hall de grandes referências.

Alguns argumentos já surgiram, um deles, o do diretor dos Musei Vaticani, Antonio Paolucci, dizendo que trata-se de 'otimismo induzido', visto que as obras que agora são atribuídas ao mestre já foram vistas diversas vezes por muitos especialistas em Caravaggio, e nenhum deles ousou dar àquelas imagens uma paternidade diferente daquela que a tradição atribuía e a história colecionística parecia justificar.

O que pensar de tudo isso? É claro que não se pode simplesmente confiar que as atribuições sejam acertadas, muitos erros ocorreram em muitos momentos anteriormente e estes estudos serão submetidos à comunidade acadêmica mundial (alias, o e-book já está a venda), mas também não se pode desqualificar simplesmente porque aquilo muda um sistema, ou uma tradição bem estabelecida.

Devemos ter em mente que a tradição é uma construção que deu certo, mas que está sempre em cheque.

Bruno Bontempo
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Adendo inútil.

Enquanto eu procurava pela imagem do Baco, me deparei com uma conhecida pintura de Caravaggio que pode nos dar um bom exemplo de que a tradição acaba se arraigando nas pessoas, e que velhos costumes acabam se tornando muito difíceis de se largar. A imagem abaixo nos mostra claramente Edward Cullen ainda jovem (vai dizer que não é a cara!?), tocando alaúde e cercado de garotos semi nus.


Os Músicos. 1595 - 1596
Metropolitan Museum of Art, New York
A figura central (Edward Cullen) é identificada por muitos historiadores da arte como um auto retrato do jovem Caravaggio, o que nos leva a conclusão de que 1. Vampiros existem; 2. Caravaggio é Edward Cullen; 3. Da pra entender porque ele nunca pega a Bella de jeito.

3 de jul. de 2012

MENARCA: blood ale

E eis que vos trago boas novas!

A infância da GYPSYbreja passou e agora nossa ideia é fértil. Não madura, mas fértil.

Vos escrevo para falar da MENARCA, nossa primeira cerveja, um símbolo e ritual de passagem, demonstrativo de nosso amadurecimento, nosso primeiro passo em direção à maturidade. Ela ainda está no fermentador e todo o processo de feitura fluiu harmoniosamente, mas não sem sustos.

Menarca é o nome dado ao primeiro período menstrual de uma garota, e nada mais apropriado do que uma cerveja vermelha para isso. A escolha do nome se deu pela sua representatividade: além de símbolo de amadurecimento, também símbolo de grande apreensão. Em conversa com algumas amigas, a impressão que tive a respeito da experiência da primeira menstruação oscilou entre estupefação, satisfação e apreensão. Afinal, a garota agora é fisiologicamente uma mulher, e mais do que o aspecto fisiológico, desponta na cabeça da garota a consciência de seu desenvolvimento, o que também é evidenciado pelas alterações físicas, emocionais e intelectuais nos ano seguintes.

Longe de ser conhecedor do desenvolvimento feminino ou qualquer coisa do tipo, peguei estes conceitos bem abstratamente e os utilizei como metáfora de uma ideia que surge pequena e acanhadamente, mas que depois de um período de crescimento, torna-se fértil, e indica um futuro bem aventurado. A fertilidade não se resume somente capacidade de procriação, mas sim, a entrada em um novo ciclo onde será criada a personalidade e a individualidade da mulher. É o que esperamos para as nossas cervejas.

Eu e o Fernando terminamos a feitura no dia 29.06, às 19:00hs. E para os próximos dias temos planejados mais dois dias de fermentação a 19/20° e a diminuição progressiva da temperatura, aproximadamente 3 graus por dia até a estabilização à 1/3° durante três dias. A novidade no processo é que não pretendemos purgar o fermento para a maturação, pretendemos parar a atuação do fermento através da diminuição da temperatura, deixando a retirada do fermento somente no momento em que faremos o priming para o envaze. A dica foi do pessoal do Lamas Bier e foi de encontro com algo que eu vinha me questionado, afinal, se o fermento deixa de agir em temperaturas menores, porque retirá-lo para a maturação, correndo o risco de contaminação e oxidação? Vamos ver no que dá.


Sobre o rótulo, não vamos fazer com a xilogravura, mas, embora tenha sido feito no computador, pretendemos manter uma estética mais voltada para a simplicidade, abusando da tipografia e com um visual mais puxado para o artesanal. Como o nome da cerveja, mesmo que simbólico e representativo, carrega um pouco de humor, escolhemos a denominação “blood ale”, que pode servir também como ferramenta de marketing aos apreciadores da Saga Crepúsculo. Se der certo, podemos lançar uma cerveja brilhante e fraquinha chamada Edward Motther Focker Cullen: shining ale ou uma cerveja sem gosto de nada, chamada Bella’s Lip: bite ale, tudo em inglês, para atrair consumidores internacionais.

Bruno Bontempo